29 de outubro de 2007
SEM TÍTULO (depois de antónio lobo antunes quem ousa inventar títulos?)
tenho para te dizer um estuário de luz que desagua na boca da manhã
tenho para te dizer os lunários e as contradanças do sonho
os anjos que caíram nas asas deste poema
tenho para te dizer qualquer coisa que não sei como trazer no coração das mãos
qualquer coisa que não tem outro movimento
senão no apertado sentido destes versos
como se eu soubesse que tudo isto não passa de um poema
para te dizer precisamente que acordei contigo nos meus olhos
27 de outubro de 2007
poema com foto de angelicatas
no coração da palavra és o coração da poesia
no coração da ilha és o coração do horizonte
no coração da flor és o coração do sonho
no coração do silêncio és o coração da paz
no coração da praia és o coração do mar
no coração da estrela és o coração da noite
e no coração do amor és o coração da vida
o coração do coração do coração do coração
daniel gonçalves
como um poema (para antónio ramos rosa)
nasceu-me uma rosa no coração
para não ter de regressar ao silêncio
nasceu-me uma rosa no coração
para voltar a entrar na casa da poesia
nasceu-me uma rosa no coração
e os nomes das coisas iluminaram-se
nasceu-me uma rosa no coração
e esqueci-me que tenho uma boca
nasceu-me uma rosa no coração
e é a ti que me dedico o seu perfume
daniel gonçalves
COMO UM POEMA QUE LEMBRASSE MIGUEL TORGA E O ATRAVESSASSE À DISTÂNCIA DE UMA MONTANHA PROFUNDA
o homem tem as mesmas raízes de deus
como se fosse a mesma árvore
que sustenta o céu
o homem vai no mesmo caminho que o seu cão
e leva na sua mão o pedaço de pão
que há-de enganar a fome aos dois
o homem sabe a palavra com que a pedra
escuta os quatro lados do vento
e a pedra sabe a palavra com que o homem
fia o silêncio das constelações pesadas da noite
o homem é o poeta e é o profundo destino do vazio
tem no seu coração a última flor do mundo
e na sua boca apenas outro grito
o homem quis revelar o mistério íntimo da vida
e fê-lo com todas as coisas que o protegeram da morte
todas as coisas que a terra soube dar
como uma bênção que um anjo esqueça propositadamente
no altar da respiração da manhã
daniel gonçalves
22 de outubro de 2007
palavras para a apresentação do livro "dez anos de solidão" em santa maria
esta ilha é uma ilha de solidão mas não é a ilha da solidão
esta ilha é uma ilha de solidão quando olha o mar em sua volta
quando se fecha para dormir sobre a eternidade
quando se leva para fora no silêncio adocicado de quem parte
esta ilha é uma ilha de solidão porque queremos que assim seja
porque se ela pudesse abraçava-nos
pegava em nós e dava-nos o seu pico mais alto para morarmos
e vermos que o mundo em volta é que é pequeno
esta ilha é uma ilha de solidão e gosto dela assim
quando me dá todo este tempo para reviver
quando me aproxima as coisas mais pequenas desta boca que tem tanta sede
esta ilha é uma ilha de solidão mas não nos deixa sozinhos
porque essa solidão é só mais uma maneira de colorir o espaço em branco
o espaço em azul o espaço em verde
o espaço em cor de sonho a cor em espaço
esta ilha é uma ilha tão grande que cabe nela toda a solidão do mundo
porque a solidão do mundo é do tamanho de uma palavra
uma palavra que se tiver que rimar rima com coração
e rima com silêncio e rima com o outono e com o inverno
e com a primavera e com o verão
e rima sobretudo com abraço porque o abraço é que dá descanso à solidão
esta ilha é a ilha de todas as ilhas onde se espera pela manhã seguinte
a ilha onde temos esta solidão virada do avesso
que é pensarmos que ninguém nos ouve
e ninguém quer saber em que parte do oceano estamos
esta ilha é a ilha de todas as ilhas que pensam que são a ilha da solidão
e há tantas ilhas assim e tão mais pequenas
ilhas que às vezes trazemos fechadas nas nossas mãos
esta ilha é tudo isto e tanto mais
porque nenhuma palavra sabe o que dizer
quando tem para dizer o que esta ilha tem para dar
e só me apetece dizer que esta ilha é a ilha do amor
e por ser assim é a ilha da poesia
e das aguarelas que mostram o lado de fora
por dentro do lado íntimo das coisas
e esta ilha somos nós
agora
com a solidão lá fora
à espreita do que estamos aqui a fazer
20 de outubro 2007
15 de outubro de 2007
5 de outubro de 2007
um poema para o carlos vaz, a maria do sameiro barroso e a gabriela funk (digníssimos amigos que vão de mãos dadas com este novo livro)
o mundo vem ter comigo como um rumor de sonho
uma existência ténue de luz que soletra a respiração
a poesia está nesse movimento que me abre as mãos
e as palavras vêm ter à boca como pássaros na praia
atordoados pela paz que o mar inventa na rebentação
não sei explicar como a metáfora se prende ao poema
nem como a água da música leva cada um dos sentidos
não sei como dentro de mim há este fogo intermitente
que me deixa dormir enquanto morrem as últimas flores
e o paraíso se completa com os nossos gatos feridos
o mundo atravessa-me o coração para que possas escutar
as mais pequenas coisas que deixas no esquecimento
tantas coisas que eu sei estão à espera da minha boca
ou da minha folha carregando o peso de cada anjo
que para cada um dos males do mundo eu invento
3 de outubro de 2007
1 de outubro de 2007
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