31 de janeiro de 2007


Felipe Monardes-Mena
deixado cá por danielsg.


se o amor é uma palavra é uma roseira esperando a tarde
se o amor é uma palavra é uma casa acordando as janelas

se o amor é uma palavra temos de lhe atar a nossa boca
e desenhar no seu coração a água que nos leva da terra

assim que percebemos a delicadeza dos nossos carinhos
quando sabemos que o horizonte se prende à nossa mão
e não há outro pensamento além do nosso sonho alado

quando ampliamos a sedição do tempo nos nossos ombros
ou estamos parados num instante à espera da eternidade
quando olhamos para a nossa sombra nos dorso da noite
e não há outra asa para nos unirmos à constelação da paz

quando sentimos os pássaros trazendo a primeira manhã
depois de termos amontoado as pedras do nosso cansaço

o amor é uma palavra porque está à espera deste carinho
deste arquipélago destas mãos deste sopro desta corrente


poema para JC

26 de janeiro de 2007


praia formosa
deixado cá por danielsg.

dez anos de solidão ou as horas todas desta vida de silêncio
para encontrar na profundeza da noite a cintilação da manhã

dez anos de solidão para silabar a poesia na luz das palavras
no mesmo carinho com que nos confiamos ao clarão do amor

dez anos de solidão com a boca atada ao cuidado da paz
com o corpo protegendo a delicada promissão do paraíso
com que cada verso se acende contra a inclinação do frio

dez anos de solidão para que me crescessem estas mãos
e houvesse buganvílias anulando a tristeza do fim da tarde
barcos com sonhos na proa e nas asas brancas das velas
levando ao último horizonte as pedras densas do cansaço

dez anos de solidão como uma casa erguida contra o tempo
onde cantasse a língua com as suas primaveras secretas

e fosse possível inventar um poema contra o esquecimento
ou o cume do inverno que é termos a morte à nossa espera


(para os que sabem o que é dez anos de solidão)

20 de janeiro de 2007


manet
deixado cá por danielsg.

a ti – só a ti – pertence o verso que falta em cada poema
em ti – só em ti – vi como o silêncio se apodera do sonho

18 de janeiro de 2007

poema com manet


13-1
deixado cá por danielsg.
agora que me cresceram as mãos e são elas a ternura
o frágil movimento de cor sobre um círculo de afectos

agora que a pele se dissolveu como uma voz à chuva
suspendendo na respiração as margens do firmamento

agora que a casa se musicou de um segredo inflamável
em cada imagem perfumada na doce seda das violetas
com a manhã crescendo no tear límpido de cada janela

toda esta maré desviada toda esta erosão desatenta
me parece agora tão nítida tão concreta tão pacífica
como se os gestos se adentrassem seguros no chão
escutando aquilo que achavam ser o pulso do tempo

agora que as palavras têm um carinho um rosto sereno
como os pássaros têm asas para um coração tão leve

acendo a pulsação transparente das pequenas coisas
e procuro o sonho a menina dos olhos do pensamento

15 de janeiro de 2007

verso(s) com foto de manuela vaz


manuela vaz
deixado cá por danielsg.

todos os dias se dilui velozmente a madrugada
será assim tão escassa a luz nas nossas vidas?

5 de janeiro de 2007

poema de amor com instante de bresson


bresson
partilhado por danielsg.


tenho um poema de amor declinado nos meus olhos
como uma transparência que emerge deste silêncio

um poema de amor que fala das coisas mais pequenas
as coisas que esperam que lhes doemos a nossa boca

estou à espera que repares na forma como te escuto
ou como te toco ou como te sinto rente aos sentidos
ou como me movo entre a tua luz entre as tuas mãos

estou à espera que encontres o coração deste poema
e sintas nele a perfumada vereda dos nossos afectos
a casa com as suas janelas alinhadas com os gerânios
e toda a delicadeza de um sonho acordado como a cal

porque eu sei que temos um lugar onde o anoitecer
é outra forma de recolher uma folha pacífica ao tempo

porque és tu quem me pega no olhar ao amanhecer
e me recolhe as primeiras palavras o primeiro poema

verso(s) com bresson


bresson
partilhado por danielsg.

quando for espírito ou palavra tranquila
flutuarei no coração da neblina

quando for nome de silêncio
crescerei como uma ilha
atravessada por uma ponte